Em 1989, houve a famigerada "O Astronauta de Mármore", versão do Nenhum de Nós para a "Starman" de Bowie - mas, naqueles tempos sem internet, quando eu morava numa cidade do tamanho de um ovo, era nunca que eu ia ter chance de conhecer a original. Em 1990, sua turnê Changes veio ao Brasil, mas, pelos relatos de indiferença do público, eu não era o único ignorante sobre ele nestas terras. Anos depois, com o mercado mais aberto e a MTV Brasil funcionando a mil, pude conhecer a literal cover do Nirvana para sua "The Man Who Sold the World". Agora, sim, que musicão da porra! Acho que preciso conhecer mais desse David Bowie, hein!?
Com a chegada da internet banda larga (com seus "impressionantes" 128 kbps, quando baixar uma única música podia levar horas), os clássicos de Bowie foram, aos poucos, pingando em meus ouvidos. "Heroes", "Space Oddity", "Rebel Rebel", "Life on Mars", "Diamond Dogs"... e, sim, a bendita "Starman" original. Bowie virou alguém familiar, que teve seu talento, valor e influência reconhecidos por mim bem antes de sua morte, em 2016. Sorte minha.
Naquele 10 de janeiro de 2016, eu vi repetir-se uma comoção que só tinha visto quando da morte de John Lennon, em 1980, e de Michael Jackson, em 2009. O mundo se uniu em homenagem para deixar bem claro: perdeu-se um artista inigualável. Era uma hora sombria.
Bowie: Stardust, Rayguns & Moonage Daydreams foi lançado em janeiro de 2020 lá fora, pela Insight Comics, e apenas um mês depois no Brasil, pela Panini Comics. 164 páginas em formato grande e capa dura, a proibitivos R$ 90. Foram 10 meses de espera até uma promoção decente, mas meu exemplar custou meros R$ 27. Boas coisas chegam para aqueles que esperam, dizem (e é verdade).
Foi co-escrito por Steve Horton (procurei suas credenciais e parece que a internet não tem muito a dizer sobre ele) e pelo também desenhista Michael Allred, artista que fez fama com Madman, X-Force/X-Statix, iZombie e, mais recentemente, Surfista Prateado. Dono de um traço nostálgico e cheio de personalidade, Allred, como grande fã de Bowie, delegou-se a missão de retratar a carreira do astro, do começo modesto em 1967 até o fim de sua fase Ziggy Stardust, em 1973, quando parecia não haver como escapar ao fascínio que a revolução artística de Bowie provocava - uma influência que se expandiu para muito além da música.
Obviamente, existem limitações quando se quer contar a vida de alguém que teve cinco décadas de carreira, durante as quais jamais deixou deixou de chamar atenção. Embora seis anos pareçam um recorte pequeno demais em uma história tão rica, foi este o período mais revolucionário da vida e da obra de Bowie, entre o auge da psicodelia e o nascimento do glam rock.
As capas icônicas, as canções inesquecíveis, as histórias por trás delas, os bastidores, acertos e mancadas, parceiros e concorrentes geniais... Está tudo aqui, em páginas visualmente soberbas (Allred capricha nas reproduções de fotos célebres e capas de discos) e cuja leitura não é exatamente rápida, mas é totalmente imersiva. É muita coisa acontecendo em pouco tempo, pois assim era a vida do homenageado.
Os anos seguintes são retratados, mas com pouco detalhamento histórico e em bem menos páginas, numa espécie de retrospectiva em fast-forward. Nada que diminua o prazer da leitura ou a importância do lançamento. O livro ainda conta com prefácio de Neil Gaiman (Sandman, Deuses Americanos) e colorização da esposa e constante parceira artística de Michael, sua esposa, Laura Allred.
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