13.7.20

Batman: As Dez Noites da Besta


Virei um mentiroso reincidente. Muitas resenhas que escrevi tocaram no sensível ponto do alto custo e do altamente desnecessário alto luxo de algumas publicações da Panini Comics, e eu meio que me desculpava por insistir no assunto. Retiro as desculpas: eu vou insistir no assunto, enquanto ele for um problema (e é, por mais que haja toda uma geração de leitores que acham capa dura mais importante do que uma tradução bem-feita, o que já é outro problema).

Sem entrar no mérito de como a DC Comics e/ou a matriz italiana da Panini exigem que a filial brasileira publique certos materiais, não existe motivo para que este Batman: As Dez Noites da Besta, por exemplo, custe ridículos R$ 94,00. Embora ele seja a cópia fiel de um volume que compila as primeiras histórias do personagem após a Crise nas Infinitas Terras, existe uma versão que reúne apenas a história principal, em quatro capítulos. Podia ter saído num capa cartão honesto, custando um quinto desse preço absurdo. As outras histórias, por mais agradáveis que possam ser, estão longe de serem clássicos imperdíveis, e podíamos passar bem sem elas.

As coisas são assim, hoje em dia: o gibi que vale 50 reais é lançado por 100, a gente compra por 60 na promoção e tem que achar bom, porque é isso ou nada. Depois, ainda vão reclamar e dizer que a culpa é de quem lê em scan.



Mas, ei, e a história?

Vista pela primeira vez em terras tapuias no distante 1989 (um dos muitos e maravilhosos lançamentos especiais da Editora Abril, por ocasião dos 50 anos do Batman), As Dez Noites da Besta traz o herói às voltas com um vilão russo (era 1987, plena Guerra Fria, e, apesar dos sinais de abertura do então presidente, Mikhail Gorbachev, russo de gibi era quase sempre malvadão). Anatoly Knyazev, codinome A Besta, é um assassino da KGB, supostamente renegado e agindo sozinho para eliminar as dez mentes por trás da IDE (Iniciativa de Defesa Estratégica, um programa militar real, que ficou conhecido como Guerra nas Estrelas). Implacável e apelidado de KGBesta, o assassino vai acumulando vítimas às dezenas, apesar dos esforços do Batman. Quando finalmente é encarado, o KGBesta revela-se um oponente muito mais preparado do que o Batman poderia supor.

Apesar de datada em seu contexto histórico, a trama é pura adrenalina, com Jim Starlin (roteiro) e Jim Aparo (arte) em grande fase, sustentando bem a releitura. Era um Batman mais detetivesco e crível, falível até, que se estropiava nas brigas e dependia menos de tecnologia. O uniforme, com azul e amarelo berrantes da era pré-digital, é basicamente uma roupa e nada mais, sem sensores ou armas embutidas. O Batman só podia contar com arpéu e corda, uns batarangues, e um ou outro truque que coubesse no cinto de utilidades (e o Robin da vez, o esquentado Jason Todd). Apesar das limitações, ele dava um jeito, e essa versatilidade é um dos traços que nos fizeram amá-lo. Hoje em dia, além de máquinas impossíveis que fazem quase tudo pra ele, o Batman ainda pode contar com soluções Deus Ex Machina de seus autores birutas (sim, estou falando com vocês, Snyder e King).



Além da memória afetiva da leitura em si, esta história ainda me traz a recordação de uma das primeiras reações de aprovação por parte de gente que vivia criticando minha mania de ler "coisa de criança" (e olha que eu só tinha 15 anos). Emprestei minha edição a um amigo, e seu irmão, que ria de meu hábito, pegou o gibi pra ler e decretou: "Aquele gibi do Batman que você deixou aqui ontem é excelente! Tem outros tão bons assim?" Claro que tinha. Era uma época em que gibi do Batman era aposta segura. Curiosamente, o personagem estava sem revista mensal desde o ano anterior e só voltaria a ter uma no começo do ano seguinte.

Qualquer que seja sua sede a matar (de curiosidade ou de nostalgia), Batman: As Dez Noites da Besta é uma boa pedida, desde que você não precise vender um rim (você só tem dois) ou sua alma (talvez ela não valha tanto assim) para tê-la na estante.


* * * * *


BATMAN: AS DEZ NOITES DA BESTA
Jim Starlin (roteiro), Jim Aparo, Mike de Carlo e outros (arte)
DC/Panini - 324 páginas - R$ 94 (preço sugerido)

2 comentários:

  1. Essa eu consegui com muito garimpo em sebos, em meados da década de 90. Época gostosa de acompanhar as publicações da Abril, em especial as do Batman.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. A gente criticava a Abril, com boas razões, mas a Panini podia aprender uma coisa ou outra com ela.

      Excluir